O coordenador da Campanha Nacional pela Anulação do Leilão da Vale fala sobre o plebiscito


Iniciada há dois anos, em um encontro em Brasília com 8 mil participantes, a Assembléia Popular tem hoje articulação com mais de 60 entidades e movimentos sociais e é a principal organizadora da Campanha Nacional pela Anulação do Leilão da Companhia Vale do Rio Doce. A assembléia está coordenando o plebiscito nacional que acontece de 01 a 09 de setembro para que a população seja consultada sobre a privatização da empresa.


A Vale foi criada na década de 40 com recursos públicos. Hoje, ela é a segunda maior mineradora do mundo em variedade de minérios e a maior produtora de minério de ferro mundial. Possui a maior frota de navios transportadores de grãos e as principais ferrovias brasileiras. A companhia ainda conta com 54 empresas, 110 mil empregados próprios e terceirizados, atuando em 14 estados brasileiros e em 17 países, nos cinco continentes.

A venda da segunda maior empresa do país há dez anos, durante o governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), ainda é alvo de vários questionamentos. De acordo com os membros da Assembléia Popular o valor estimado da companhia em 1997, época do leilão, era de R$ 92 bilhões, mas a empresa foi vendida por R$ 3,3 bilhões, ou seja, 28 vezes menos. Este e outros questionamentos deram origem a mais de cem ações populares contra o leilão, das quais 69 ainda estão em andamento.

Iniciada há dois anos atrás, em um encontro em Brasília com 8 mil participantes, a Assembléia Popular agora prepara o Plebiscito pela Nulidade do Leilão da Vale do Rio Doce para consultar o povo brasileiro sobre a privatização da empresa. Em entrevista à Radioagência Notícias do Planalto, o coordenador da Assembléia Popular e secretário continental do Grito dos Excluídos nas Américas, Luís Basségio, fala sobre o plebiscito e sua importância para a soberania do povo brasileiro.

Entrevista publicada originalmente no portal da Radioagência Notícias do Planalto

 

Este não é o primeiro plebiscito que esta articulação de movimentos sociais organiza. Já aconteceram outros plebiscitos, que trataram de assuntos como a Dívida Externa e a Alca. Qual é a importância deste tipo de atividade?

 Esse tipo de atividade nós entendemos como uma escola de formação política, é uma escola de cidadania, porque, na verdade, ao levantar um tema destes nós estamos debatendo questões relativas à um projeto popular para o Brasil. Que Brasil nós queremos? Como é que nós queremos que seja o Estado, a educação, a saúde, a questão da terra, o transporte, enfim, é ouvir a vontade popular sobre determinados temas. Porque nós entendemos que se não for o povo e os movimentos sociais os protagonistas, nós não vamos construir um projeto que atenda à maioria da população brasileira.

Quando começou o processo de construção deste plebiscito?

 No final do ano passado, numa reunião da Assembléia Popular em Brasília, nós optamos por este tema. Organizamos grupos que prepararam os materiais, como cartazes, cartilhas, jornais. E no começo do ano começamos o processo de formação sobre os porquês deste debate, desta batalha que nós vamos enfrentar. Fizemos os cursos nos estados para formar multiplicadores do debate. Há também toda a organização das urnas e dos locais de votação. Em outubro, nos reuniremos em mais uma assembléia popular para divulgar os resultados do plebiscito e vamos fazer uma marcha para entregá-los aos poderes executivo, legislativo e judiciário.

Por que questionar a privatização da Vale?

 Tem motivações econômicas, políticas, sociais, jurídicas, éticas que nos garantem essa luta. Não houve debate com a sociedade, o Congresso não aprovou, a Vale foi subfaturada, há entidades como o Bradesco que participaram da avaliação da Vale e que depois viraram acionistas. Ou seja, tudo foi feito de forma muito espúria. Além disto, ainda estão em curso 103 ações populares pedindo anulação do leilão.

E do ponto de vista ético, a gente não pode vender o nosso solo, o mar, a água, o ar. E é a mesma coisa com o subsolo, quanto menos sem ter havido antes um grande debate e sem ter pesquisa suficiente que diga quanto realmente vale a Vale.

É por isso que, com o plebiscito, estamos pressionando para que se decrete a nulidade do leilão da Companhia Vale do Rio Doce. E não a anulação. Porque nulidade significa que houve falhas no processo de venda. A anulação trataria de possíveis cláusulas do contrato que não estão sendo cumpridas.

Alguns setores que defendem a privatização dizem que o valor de mercado da Vale hoje é alto justamente porque ela foi privatizada. O que vocês acham disso?

 Primeiro, isso não é verdade. Como já falamos, várias de nossas riquezas não foram contabilizadas na hora da venda. Ou seja, ela foi subfaturada para ser leiloada. Em segundo, empresa estatal não tem como primeiro objetivo dar lucro. O objetivo dela é a felicidade e o bem-estar da população. Em terceiro, de que adianta uma empresa com altos lucros, se este dinheiro não é investido para melhorar a vida da população? Então, por que não ser uma empresa estatal, gerenciada de forma ética, competente e com o lucro destinado para saúde, educação, etc.?

O plebiscito tratará apenas da privatização da Vale do Rio Doce?

 Nós vamos tratar da nulidade do leilão, da reestatização da Vale. Nós vamos debater também a dívida externa, a reforma da previdência e a privatização do setor elétrico.

Como as pessoas podem participar do plebiscito?

As pessoas têm que procurar os movimentos sociais. No MST, na Via Campesina, nas Pastorais Sociais, como pastorais do Migrante, da Terra, Operária. Nas comunidades de base, nas igrejas, nos sindicatos e nas associações. Em cada estado há também um comitê organizador. Lá, busquem materiais e organizem dias de formação, tanto sobre o conteúdo como para organização em si do plebiscito. E há toda uma equipe nacional disponível para dar essa assessoria.