Universidade sitiada?


 

O debate sobre a universidade pública está na ordem do dia. A ocupação da reitoria da USP, a maior do país, chamou a atenção de toda a sociedade para os problemas por quais passam essas instituições. Com a discussão no ar, setores envolvidos com a questão realizaram diagnósticos e emitiram opiniões de como encontrar soluções para a crise instalada.

Crise atribuída aos estudantes, mas que é gerada de fato pelo Palácio dos Bandeirantes, quando apostou na passividade de muitos dirigentes, professores e funcionários para realizar a sua política de maneira tão vertical.

Coube ao movimento estudantil, como na maioria das vezes, iniciar a confrontação em defesa da educação pública.

O movimento na USP e nas demais instituições não acontece sobre um vazio, por capricho ideológico ou voluntarismo juvenil. O fato é que a educação do Estado de São Paulo e do Brasil vivencia uma crise aguda. E os decretos só vieram a reforçar esse cenário.

É na década passada que a crise se gesta. As políticas neoliberais chegaram à universidade sob a forma de corte de verbas, carência estrutural, reinado dos índices de produtividade (vide "papers"), desprezo pela ciência básica e hiper-valorização da relação com o "mercado". Esses fatores deformaram a idéia de universidade e criaram cursos de 1ª, 2ª e 3ª categoria, além de implodir o tripé ensino, pesquisa e extensão.

Desta forma, a busca da autonomia administrativo-financeira e democratização das instituições, concebidas na transição do regime militar para a nova república, não tiveram ambiente possível para se consolidarem. E, agora, a antiga conquista do Estado de São Paulo –autonomia financeira para as universidades – sofre um processo de ataques que mina as suas bases e nesse momento a coloca em risco.

O Governador José Serra promove duro golpe nas instituições paulistas. Ao promulgar os decretos de janeiro e intervir no conselho de reitores (Cruesp), com a nomeação de José Pinotti (o novo Secretário de Ensino Superior) para presidente, Serra feriu a autonomia administrava e financeira. Mesmo com os recuos, ao devolver a presidência do conselho aos reitores e atenuar o texto dos decretos em uma revisão, ficou claro a sua intenção de enquadrar as universidades paulistas.

Em São Paulo, se a situação é esta, nas instituições federais de ensino também encontramos problemas. Durante a gestão Paulo Renato ocorreu um estrangulamento financeiro brutal, resultando em casos lamentáveis como o da UFRJ, que ficou sem dinheiro para pagar até a conta de luz. No governo de Lula, temos acompanhado um aumento nos investimentos, tanto em verba de custeio, como na contratação de pessoal. Mas sabemos que os valores ainda são insuficientes para corrigir a distorção gerada nos governos passados.

Para se ter uma dimensão do problema: o orçamento da USP, por uma vitória histórica, acabou sendo vinculado à arrecadação do ICMS do estado, resultando em um orçamento em 2006 de aproximadamente 2 bilhões de reais. Já todas as 55 universidades federais juntas, mesmo com os investimentos atuais, receberam valor aproximado de 7 bilhões e meio em 2006. Imaginem então a situação das federais, com esse diminuto orçamento.

Por isso, a União Nacional dos Estudantes (UNE) abriu essa semana uma jornada de mobilizações nas Instituições Federais de Ensino Superior do país. Ações que visam chamar a atenção, uma vez mais, da sociedade e governo para os problemas que afetam o ensino superior brasileiro.

Defendemos: 1) a criação do Plano Nacional de Assistência Estudantil, com rubrica orçamentária específica que contemple a construção e ampliação das condições de permanência dos alunos; 2) a garantia de autonomia administrativa e de gestão financeira para as Instituições, além da democratização da Universidade em todos os âmbitos; 3) a derrubada dos vetos ao Plano Nacional de Educação, garantindo o investimento de 7% do PIB destinado à educação.

A universidade está sitiada, mas não é pelos estudantes. O que cerca a universidade são os interesses escusos de uma política de desmonte da instituição pública e as pressões do "mercado". Nós, estudantes, estamos é do lado de dentro, defendo uma vez mais, a universidade pública nesse país.