Como ministro do apagão, Parente também tentou dolarizar a conta de luz

Avisos não faltaram. A FUP alertou várias vezes sobre os riscos que a Petrobrás e o país corriam com a nomeação de Pedro Parente para a presidência da empresa.

Nos anos 90 e início dos anos 2000, como homem de confiança do governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), ele já havia sido responsável por uma série de escândalos, como socorro a bancos privados e o apagão elétrico, quando, chegou a sugerir a dolarização da conta de luz.

Também foi colocado por FHC no Conselho de Administração da Petrobrás, onde autorizou a venda da Refap e obrigou a empresa a assinar contratos de parceria com o setor privado para construção de usinas termoelétricas, se comprometendo a garantir a remuneração dos investidores, mesmo que as empresas não dessem lucro.

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Os dez dias de caos que sua política de reajuste dos combustíveis causaram ao País já tinham atecedentes. Assim como indexou ao dólar e ao barril de petróleo os preços dos derivados que a Petrobrás produz nas refinarias, Pedro Parente tentou fazer o mesmo com a energia elétrica, em 2001.

Na época, ele era ministro-chefe da Casa Civil e responsável por gerenciar o apagão. Em entrevista concedida ao jornal O Globo ele defendeu reajustar contas de luz com base na variação do dólar, como fez com os combustíveis. “Não é razoável admitir que distribuidoras arquem com um custo que não estava previsto”, afirmou na época. 

Leia a entrevista na íntegra: 

GLOBO 15/07/2001

Dólar pode corrigir conta de luz

BRASÍLIA. O governo está preparando mudanças no cálculo dos reajustes das tarifas de energia elétrica para garantir os investimentos privados no setor. O ministro-chefe da Casa Civil, Pedro Parente, que está no comando da Câmara de Gestão da Crise, disse que a variação do dólar – tanto para cima quanto para baixo, frisa – poderá ser incluída na nova fórmula, num sistema semelhante ao que hoje é usado para os combustíveis. “Não é razoável admitir que distribuidoras e investidores arquem com um custo que não estava previsto nas equações financeiras que foram decididas pelo governo para o negócio”, justifica. Segundo Parente, a crise de energia está sob controle.

Sergio Fadul, Mônica Tavares, Helena Chagas e Cristiane Jungblut

O Globo – O governo já está com a crise energética sob controle?

PEDRO PARENTE: Não acabou o risco, mas conhecemos a situação, temos uma visão detalhada. Começamos a ver qual é a situação deste sistema por causa dos diversos níveis da hidrologia. Então precisamos de um seguro para esta situação. Queremos que, mesmo no pior ano, o máximo de redução seja de 5%. Queremos ter um adicional de carga de cerca de 2.700 MW médios no Sudeste/Centro-Oeste. Por isso, fizemos um programa emergencial que nos dê 3 mil MW médios. Se for bem sucedido, a situação para 2002, mesmo que aconteça o pior, será resolvida não com racionamento, mas com racionalização.

O Globo -Já é possível saber até quando vai durar o racionamento?

PARENTE: O que posso dizer além de quatro semanas é que se a economia continuar e a hidrologia ficar dentro do previsto ou acima, como está acontecendo agora, não vamos precisar de apagão. Qual o nosso desejo? É ter esta questão do seguro logo resolvida e lá para novembro e dezembro ter uma posição. Não vamos fazer qualquer declaração que depois não possamos cumprir. Este é um ponto de honra do presidente, não dá nesta área para ser surpreendido ou surpreender de novo a população, principalmente pelo lado negativo.

O Globo -Mas esse custo será repassado para a tarifa?

PARENTE: Essa energia será bem mais cara, não tenha dúvida, dependendo do combustível usado nas termelétricas. Esta energia é composta de duas coisas: a compra ou aluguel de equipamento, que dá um custo mensal, que pode ser leasing ou depreciação, e o custo do combustível. O que sempre se disse é que era uma energia mais cara, e que se ela for mais cara e for consumida, de alguma forma o custo tem que ser coberto por tarifa. Não faz sentido obrigar os contribuintes (via subsídios) a pagarem por uma coisa que eventualmente não consumiram. Não mais do que um quarto do custo do leasing necessariamente vai para a tarifa. O custo do combustível ainda há uma discussão de quem pagará. Com certeza, não vamos fazer aumento linear de tarifas.

O Globo -Algumas distribuidoras estão pedindo reajuste extra por causa da alta do dólar? Será concedido?

PARENTE: Esta discussão está ligada à questão do modelo do setor e não podemos fugir dela. Não é razoável admitir que distribuidoras e investidores arquem com um custo que não estava previsto nas equações e projeções financeiras que foram decididas pelo próprio governo. Se é um custo não é gerenciável pela distribuidora, é uma discussão que precisa ser feita. Nós não podemos esquecer que é muito bonito falar: olha vamos impor isto às distribuidoras. E, no momento seguinte, o que temos é a não realização dos investimentos que precisamos. O governo não tem dinheiro para investir nesta área. Podemos dar uma de demagogo, eu estaria em uma situação muito confortável, dizendo “pau nas distribuidoras, pau nos investidores”, só que isto é contra o interesse do país. Não estou defendendo qualquer reajuste específico. Esta é uma questão que precisa ser discutida com objetividade e sem emocionalismos. Há coisas razoáveis e outras não.

O Globo -O aumento do dólar está entre as razoáveis?

PARENTE: De fato é um custo não administrável pela distribuidora. Não se pode fugir da discussão porque o país precisa destes investimentos. Seria fácil fazer demagogia dizendo que esse pessoal (as distribuidoras) é contra o consumidor…E daí, o consumidor não precisa de energia? E essa energia escassa não pode ter um preço muito mais caro no futuro? Essas coisas precisam ser vistas com este grau de isenção, porque se não, com certeza, a maioria é que sai perdendo.

O Globo -Então, pode acontecer reajuste até o fim do ano por causa do dólar?

PARENTE: Do jeito que o dólar subiu, ele pode descer. Esta questão do reajuste precisa ser vista nas duas direções. Para cima e para baixo. Tenho a clara convicção de que o nível atual do dólar é extremamente exagerado para os fundamentos da economia brasileira.

O Globo -Será como nos combustíveis?

PARENTE: A fórmula ainda está sendo discutida. Você pode fazer anualmente, compensando adequadamente os custos das empresas. Não precisa fazer toda hora. O que eu insisto é que a discussão precisa ser feita à luz do que é razoável. Vejo o problema concreto: não temos o dinheiro necessário para fazer investimentos. Precisamos gerar um clima que seja favorável ao investidor privado e isto supõe que você não pode propor para eles aquilo que não é da lógica do negócio, um risco que não é do negócio.

O Globo -Na próxima sexta-feira, dia 20, começará mesmo a ser cortada a luz das empresas que não cumpriram a meta?

PARENTE: Não cortar é descumprir a lei, que foi confirmada pelo Supremo Tribunal Federal. Para as grandes empresas, que eram para ser cortadas já no início do mês, foi dado o prazo até o dia 20 para que pudessem demonstrar junto às concessionárias que economizaram neste período, de forma a compensar o que ultrapassaram, ou através de geração própria. Se isto tudo no dia 20 não estiver comprovado, então infelizmente não há outra alternativa. É uma questão de justiça. Há empresas e famílias que estão fazendo das tripas coração para cumprir o limite.

[FUP, com reprodução de entrevista de O Globo]