Greve Geral de 1983 faz 37 anos e destaca desafios da organização sindical

[Do portal da CUT]

A greve geral de 21 de julho de 1983, que completa 37 anos nesta terça-feira (21), foi considerada importante para a história da classe trabalhadora brasileira e um marco no sindicalismo brasileiro pelo tamanho, pela forma que foi organizada e pela época em que foi realizada, em plena ditadura militar, que durou de 1º de abril de 1964 até 15 de março de 1985.

‘Fora Daqui o FMI’ foi o grito que ecoou nas ruas daquela paralisação de 24 horas que aconteceu em diversas capitais em resposta a política econômica aplicada pela ditadura militar do governo do general Joao Batista Figueiredo.

Subordinado ao Fundo Monetário Internacional (FMI), o então presidente da República jogou o ônus da crise nas costas do trabalhador e da trabalhadora, com uma série de decretos que mudaram as regras para a política salarial aumentando o arrocho salarial, vencimentos abaixo da inflação e menos investimentos na área social. A elevação do desemprego e do custo de vida foram as consequências imediatas da política econômica do general.

MEMORIAL DA DEMOCRACIAMemorial da Democracia
Cartaz da convocação da greve

A greve geral de 1983 mobilizou mais de dois milhões de trabalhadores e trabalhadoras diretamente e impactou outras mais 40 milhões de pessoas e foi o caminho encontrado pelo conjunto de mais de cem entidades sindicais para a luta em defesa dos direitos da classe trabalhadora. Porém, não foi uma mobilização que surgiu de um dia para o outro e nem foi convocada por uma única, grande e fenomenal liderança.

A greve geral de 1983 aconteceu porque foi protagonizada pela classe trabalhadora e uma das principais conquistas foi a criação da Central Única dos Trabalhadores (CUT), fundada em 28 de agosto, um mês após a paralisação.

A análise foi unânime entre os entrevistados pelo PortalCUT para falar sobre a greve. Um petroleiro, um historiador e uma arquiteta, que, de formas diferentes, participaram daquele momento.

Para Clara Ant, que fazia parte da Comissão pró-CUT, a união de diversas categorias, os anos de ditadura militar, as sucessivas ondas de lutas por melhores condições de trabalho, como as greves dos metalúrgicos no ABC ainda no final de 1979, a greve dos petroleiros, dias antes da greve geral, a luta pela anistia, o processo de construção do movimento por Diretas Já e mobilização para a criação da Central que aconteciam no período ajudaram a construir a greve geral de 1983.

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Protesto na av. Rio Branco, centro do Rio de Janeiro, contra o endurecimento do arrocho salarial

“A retomada do movimento sindical e da busca por uma unificação das categorias se dava naquele período de luta. A 1º Conferência Nacional da Classe Trabalhadora [a Conclat] em 1981, que criou a comissão para construir a CUT, representou um passo gigante para classe trabalhadora durante o século XX inteiro, mas o estopim para a paralisação do dia 21 foi a greve dos petroleiros, que aconteceu dias antes, num momento de ruptura da ditadura em que uma categoria forte e muito organizada enfrentou a proibição de fazer o enfrentamento”, afirmou Clara, uma das fundadoras da CUT, se referindo Lei nº 4.330, conhecida como Lei Antigreve, vigente na época.

Em 5 de julho de 1983, os petroleiros da Refinaria Paulínia (Replan), no interior de São Paulo, davam início a uma greve que durou sete dias e teve adesão também dos trabalhadores da Refinaria Landulpho Alves (Rlam), na Bahia. Um movimento essencialmente político contra a ditadura e que estourou com um decreto de Figueiredo para cortar direitos dos trabalhadores de estatais e reduzir efetivos. A repressão policial foi violenta, inclusive dentro dos locais de trabalho. Sindicatos foram fechados, diretorias cassadas e teve até lista de demissões.


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SINDIPETROSindipetro
Mobilização da greve dos petroleiros

Segundo o petroleiro aposentado, Wagner Lima, a mobilização estava forte assim como a repressão e naquele momento a imprensa quase não noticiava o lado da categoria e ainda os chamavam de baderneiros para confundir a opinião pública e os familiares. Para ele, mesmo não sendo noticiada pela grande imprensa, a greve foi um divisor de águas na história da classe trabalhadora.

Wagner conta a greve foi articulada com os mais de 12 sindicatos da categoria que tinham na época, mas nem todos foram mobilizados e isso mostrou de fato a força e o compromisso dos sindicatos de luta com o trabalhador. E que foi a partir daqueles dias de paralisação que se deu, além da greve de 1983, uma evolução do processo negocial e da organização.

Tribuna Metalúrgica

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“A gente tinha deito a discussão coletiva e houve um compromisso na plenária de dirigentes sindicais que iniciaríamos a greve e quando a coisa pegou só ficaram os Sindpetros [Sindicatos dos Petroleiros] de Paulínia e Campinas e da Bahia e isso o foi um choque. Toda pelegada, que se dizia pró-CUT afinou no momento mais importante e isso nos mostrou que de CUTistas não tinham nada. Mas mesmo assim, permanecemos em protesto por uma semana, com apoio de diversos trabalhadores, inclusive dos bancários de São Paulo, e vimos estourar logo depois a greve geral”, afirmou Wagner, que naquela época se tornou dirigente sindical.

Diversos setores da sociedade, estudantes, partidos de esquerda, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Associação Brasileira de Imprensa (ABI), entre outros, se solidarizaram com os trabalhadores, manifestando-se publicamente contra o decreto. Várias bases de petroleiros aderiram ao estado de greve no  Rio Grande do Sul, Pará, Minas Gerais, Cubatão e Duque de Caxias. Os metalúrgicos do ABC também se solidarizam com a luta no IV Congresso da categoria e nos dias 7 e 8 os trabalhadores e trabalhadoras começaram também com passeatas, paralisações e mobilizações contra o governo e a ditadura do país.

“Os trabalhadores e seus movimentos tiveram relevância naquele processo da redemocratização e muita luta e a construção dessa memória coletiva mostra que a classe trabalhadora é sujeito de transformação social. E a CUT é prova disso”, afirma o historiador e coordenador do Cedoc da CUT, Antonio Marques, o Toninho, se referindo às reivindicações de 1983 que depois foram conquistadas, como o salário-desemprego e a redução da jornada de trabalho.

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No editorial da Tribuna Metalúrgica edição 69, que foi veiculada entre os meses de agosto e setembro de 1983, o então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Jair Meneghelli, disse que a greve do dia 21 de julho foi a mais importante manifestação dos trabalhadores depois de quase 20 anos de ditadura militar. E que apesar de não ter atingido todo o território nacional, conquistou a adesão de importantes setores e categorias nos principais centros urbanos do país e ensinou-nos inúmeras lições.

Segundo ele, os trabalhadores demonstraram com seus protestos, que não aceitam pagar pela crise criada pelos patrões e pelo governo, como também não aceitam abrir mão de seus direitos e reivindicações para aderir aos chamamentos de uma “conciliação nacional” ou de um “pacto social”, conforme querem as classes dominantes para manter o sistema de exploração e opressão.

Jair disse também que a greve provou que apesar de todo o boicote da imprensa, a classe trabalhadora está mais preparada e mais disposta a enfrentar, na luta, a política econômica do governo, mas que também era urgente uma renovação sindical.

O dirigente finalizou o texto dizendo que uma nova mobilização da classe trabalhadora seria decidida no próximo Conclat que aconteceria em agosto, quando foi fundada a CUT.

“Se erramos na greve do dia 21, foi por não termos dado um prazo para tais negociações e nem ter marcado a data da nova greve geral, que certamente seria muito mais ampla do que a última. Mas essa deverá ser uma decisão do Conclat, que esperamos possa corresponder a todas as esperanças e expectativas da classe trabalhadora”, disse o sindicalista.

Meneghelli coordenou dias depois, no dia 28 de agosto de 1983, a Direção Nacional Colegiada no Conclat que reuniu mais de 5 mil delegados, representando 12 milhões de trabalhadores da cidade e do campo em São Bernardo do Campo. A CUT foi fundada, tendo como principais eixos de luta pelo fim da ditadura, a revogação da Lei de Segurança Nacional e a garantia de liberdade e autonomia sindical.

Para saber mais

O livro “Nasce a CUT” de autoria historiador e coordenador do Cedoc da CUT, Antonio Marques, o Toninho, conta mais detalhes das lutas da classe trabalhadora daquele período e também da criação da CUT.

No site “memorial da democracia” tem uma linha do tempo que conta os 21 anos de resistência e luta também tem mais informações sobre a luta da classe trabalhadora.