Resistência em vez de comemoração: Luta contra as privatizações marca os 67 anos da Petrobrás

Em meio ao maior desmonte de sua história, a Petrobrás completou 67 anos neste sábado, 3 de outubro, com um passado de histórias brilhantes e o futuro comprometido. O aniversário da empresa mais estratégica da América Latina é motivo de orgulho para os seus trabalhadores e para o povo brasileiro, mas, acima de tudo, é uma data de resistência. Por isso, em vez de celebração, o dia foi marcado por protestos contra o avançado processo de desintegração do Sistema Petrobrás e sua privatização “aos pedaços”.

Situação que irá piorar com a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que permitiu ao governo Bolsonaro fatiar a estatal para vender refinarias, dutos, terminais e demais ativos, sem autorização legislativa.

“Desde o início deste governo, a atual gestão da Petrobrás tem tomado decisões para supostamente beneficiar seus acionistas, mas que estão esquartejando o patrimônio da empresa e suas possibilidades futuras de ter mais lucro. A Petrobrás, que é uma empresa brasileira, que opera, investe e emprega de norte a sul do país, está virando uma companhia que opera só no Rio de Janeiro e São Paulo, situação que vai piorar com a venda das refinarias. O que vai sobrar da gigante Petrobrás?”, ressalta Deyvid Bacelar, coordenador geral da FUP, que participou do ato virtual Pela soberania nacional, em defesa do povo brasileiro.  

A atividade fez parte de uma grande mobilização contra as privatizações, realizada ao longo de todo o dia por uma frente nacional composta por mais de 50 entidades que integram a Plataforma Operária e Camponesa da Água e da Energia, o Comitê de Lutas Contra as Privatizações e as frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi um dos convidados do ato virtual e afirmou que a defesa da Petrobrás simboliza a defesa de todo o patrimônio do povo brasileiro, das estatais aos recursos naturais. Ele também fez um grave alerta: a soberania nacional continuará ameaçada enquanto o governo Bolsonaro continuar “lambendo as botas do governo americano”.

“Quando você tem um Brasil que coloca um general nosso pra ser subordinado a um general americano no comando da Quarta Frota, que é a frota americana pra tomar conta do Oceano Atlântico e para vigiar o nosso petróleo, quando você tem um presidente da República que vive todo santo dia lambendo as botas do governo americano mesmo quando o governo americano fala bobagem contra o Brasil, quando você tem um ministro da Educação, um ministro das Relações Exteriores que lambe as botas do presidente norte-americano, que é tão troglodita quanto o nosso, que é um cara violento, que não acredita na democracia nem respeita os direitos humanos, o que você pensa da nossa soberania? Ela está correndo risco”, afirmou.

Atos denunciam desmonte acelerado da Petrobrás

Ao longo de todo o dia, os sindicatos da FUP realizaram atos simbólicos em várias capitais do país em defesa da soberania nacional. No Rio de Janeiro, os Arcos da Lapa amanheceram com uma imensa faixa, convocando a população a defender a Petrobrás (veja fotos abaixo). Em frente à sede da estatal, na Aveneida Chile, um ato reuniu diversos trabalhadores do setor públicos e movimentos sociais, que reafirmaram o compromisso com a defesa do patrimônio do povo brasileiro, em um abraço simbólico do prédio.

Na Bahia, a manifestação foi pela manhã, no bairro de Lobato, em Salvador, no local onde foi descoberto o primeiro poço de petróleo do Brasil. Os petroleiros também realizaram um ato no município de Maragogipe, no Recôncavo baiano, cuja economia girava em torno das encomendas da Petrobrás ao Estaleiro Enseada Paraguaçu, que, após a Lava Jato, foi desativado. Hoje o município é o retrato da devastação da indústria de petróleo no Brasil.

Em Manaus, o aniversário da Petrobrás foi comemorado em tom de protesto em um ato realizado pelo Sindipetro-AM no centro histórico da cidade, com participação de várias categorias e entidades dos movimentos sociais. Os petroleiros também fizeram atos simbólicos em Belo Horizonte, Fortaleza, Curitiba, entre outras cidades.

Pobreza, desemprego e insegurança no rastro das privatizações

Levantamento feito pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE) com base em números divulgados pela própria Petrobrás mostra uma aceleração, desde o início de 2019, das ações de venda de ativos, redução de contratações – de trabalhadores próprios e terceirizados –e de investimentos. Essas ações fizeram a Petrobrás retroceder a indicadores anteriores à descoberta do pré-sal, em 2006. No caso dos trabalhadores, os números atuais são similares aos que a empresa detinha nos anos 1970/1980, quando descobriu a Bacia de Campos e começou a ampliar seu parque de refino.

Em 2005, antes do pré-sal, os investimentos totais da Petrobrás em valores nominais foram de US$ 10,6 bilhões. Para este ano, a projeção é de US$ 8,5 bilhões. Essa cifra menor poderia ser justificada pela pandemia de Covid-19, que mexeu com todo o mercado de petróleo e o consumo de combustíveis. Entretanto, em 2019 o investimento total da companhia foi de US$ 10,75 bilhões – ou seja, já nos níveis de 2005, sem pandemia.

A compra e venda de ativos faz parte da estratégia empresarial de qualquer empresa, e não é diferente com a Petrobrás. Entretanto, apenas de janeiro de 2019 a julho de 2020, a média mensal de teasers de vendas foi de 2,5. Entre junho de 2016 e dezembro de 2018 (ou seja, dois anos e meio), essa média foi de 1,4. Já entre janeiro de 2013 e maio de 2016 (três anos e meio, a média de teasers foi de 0,4 por mês.

Um dos últimos anúncios feito pela Petrobrás motivou uma ação popular com pedido de tutela de urgência na 1ª Vara da Justiça Federal de Campos dos Goytacazes (RJ) contra a Petrobrás e a União para impedir que a empresa venda os campos de Albacora e Albacora Leste, na Bacia de Campos, e suas instalações. A ação foi ajuizada pelo Sindipetro-Norte Fluminense, representado por seu coordenador geral, Tezeu Bezerra, e alega que o ato da estatal “põe em risco o patrimônio público em razão de falta de análise de gestão de crise e de alienação da participação em setores altamente lucrativos”.

Albacora Leste abriga a P-50, plataforma que, em 2006, garantiu a autossuficiência brasileira em petróleo. Entretanto, mesmo com o campo ainda produzindo em média 30,7 mil barris por dia e com potencial já descoberto pela Petrobrás no pré-sal, a empresa colocou-o à venda.

Quanto aos empregos, entre dezembro de 2013 e dezembro de 2019 a Petrobrás reduziu seu número de trabalhadores próprios em 32,7%, o maior percentual de redução entre grandes petroleiras e ao contrário da francesa Total, que aumentou em 9,1% seu número de trabalhadores no mesmo período. A situação foi ainda pior entre os terceirizados: foram menos 273.150 trabalhadores entre o fim de 2013 e o fim do primeiro semestre de 2020.

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